Todo sabemos que nutrientes são essenciais para o desenvolvimento das plantas. No entanto, a fertilização em excesso pode ocasionar problemas no cultivo, prejuízos ao solo e ao meio ambiente, além de representar custos desnecessários. Portanto, independente da fonte do fertilizante (orgânico ou mineral), é importante ter em mente que “a diferença entre o remédio e o veneno está na dosagem”.
Dependendo do caso, adubações em excesso podem causar danos que vão além da queda na produtividade da safra atual, podendo comprometer as safras seguintes e a própria área de cultivo. Além disso, a resolução do problema pode custar muito caro ou demandar muito tempo para ser surtir efeito.
Veja quais são os principais problemas causados pelo excesso de nutrientes na adubação:
1 – Antagonismo e competição
O desequilíbrio nutricional no solo pode promover dificuldades para as plantas na absorção de nutrientes. Em outras palavras, o excesso de um nutriente no solo pode promover a redução na absorção de outros, ocorrendo um fenômeno conhecido como antagonismo. Ou então, os nutrientes podem competir pelo mesmo sítio de absorção e aquele que estiver em excesso pode bloquear a absorção dos outros, através da chamada inibição competitiva.
O efeito de antagonismo é notadamente observado entre os nutrientes potássio (K), cálcio (Ca) e magnésio (Mg). O teor destes elementos no solo precisa estar em equilíbrio para garantir a plena absorção de cada um deles. Adubações potássicas muito pesadas reduzem a absorção de Ca e Mg pelas plantas, assim como o aporte de grandes quantidades de Ca no solo pode inibir a absorção de K e Mg. Destaca-se também o antagonismo causado pelo excesso de fósforo (P) em relação ao boro (B) e zinco (Zn), que são micronutrientes importantes especialmente para frutíferas como a videira.
Na tabela abaixo, observa-se a interação positiva (+) e negativa (↓) da adição de um nutriente no solo sobre o efeito no teor foliar dos outros nutrientes.
2 – predisposição à doenças
Uma planta com deficiência ou excesso nutricional geralmente é mais vulnerável a doenças do que uma planta em condições nutricionais ótimas. Logo, o equilíbrio dos nutrientes é importante, pois confere maior resistência contra ataque de patógenos.
Alguns nutrientes, como o cálcio e o potássio, podem enrijecer os tecidos e torná-los mais resistentes. O nitrogênio, por sua vez, quando aportado em excesso, torna os tecidos mais sensíveis ao ataque de patógenos. Este dano causado pelo excesso de N pode ser justificado pela redução na síntese de compostos fenólicos como as fitoalexinas e lignina, o que torna a planta mais tenra e menos resistente às infecções fúngicas (Marschner, 1995).
Conforme apresentado anteriormente, o desequilíbrio nutricional pode causar problemas de absorção de determinados nutrientes, como exemplo do antagonismo do K (potássio) sobre Ca (cálcio) e Mg (magnésio). Como o cálcio é importante para a composição da parede celular, conferindo estabilidade e resistência à estrutura, a deficiência desse elemento diminui a capacidade de defesa da planta contra patógenos, onde a ação de enzimas liberadas pelos fungos se torna facilitada.
A condição de maior susceptibilidade também é observada no déficit de outros elementos como o K, que pode ser causado pelo excesso de Ca e Mg. Neste caso, a deficiência de K promove aumento na concentração de aminoácidos e açúcares solúveis na folha, contribuindo para a germinação de esporos e crescimento dos fungos. Na falta de potássio também ocorre a diminuição da velocidade de cicatrização de injúrias, menor lignificação e menor espessura da cutícula e parede celular, reduzindo a resistência à penetração dos patógenos.
3 – Excesso de vigor
Adubações com excesso de nitrogênio podem promover aumento demasiado de vigor vegetativo nas plantas, resultando em desbalanço entre estruturas vegetativas e reprodutivas. Ou seja, a planta acaba produzindo muitos ramos e folhas, com maior vigor, e dá menos prioridade para formação de flores, frutos, tubérculos ou raízes tuberosas. Além disso, pode haver prolongamento da fase vegetativa e atraso na entrada do estádio reprodutivo.
Estes sintomas são observados especialmente em frutíferas e plantas onde o produto comercial são raízes ou tubérculos, como os casos da batata e mandioca. Em estudos realizados com macieiras, observou-se que o teor excessivo de N em plantas jovens retardou a entrada das plantas em produção e deprimiu a formação de estruturas de órgãos reprodutivos, diminuindo, conseqüentemente, o número de frutos por planta (Iuchi et al., 2001). Em uvas viníferas, observa-se queda na qualidade dos frutos com excesso de nitrogênio na adubação.
4 – Estresse por salinidade
Alguns fertilizantes, quando aplicados em grande quantidade ou muito concentrados na base da planta, aumentam a salinidade do ambiente radicular e levam a planta a condições de estresse. Podem ocorrer dois tipos de danos por elevada salinidade: o estresse osmótico, onde a planta sente como se estivesse necessitando de água, e o estresse iônico, onde os elementos em excesso causam toxidez. No primeiro caso, a planta tem dificuldade de absorver água pelas raízes e acaba adaptando rapidamente seu metabolismo para uma condição de estresse hídrico, reduzindo o crescimento da parte aérea. Em casos mais extremos, a planta pode desidratar até sofrer danos mais sérios.
Os fertilizantes possuem diferentes níveis de salinidade, conforme sua formulação. Na tabela a seguir, apresenta-se alguns dos principais fertilizantes minerais utilizados e seus respectivos índices salinos, condutividade elétrica e índice de acidez e alcalinidade.
A cultura do morangueiro, que é muito sensível à elevada salinidade, apresenta sintomas de injúria como necrose das folhas, folhas frágeis e quebradiças, podendo ocorrer morte de raízes. A imagem a seguir ilustra os sintomas descritos:
5 – Toxidez
Alguns nutrientes, quando absorvidos em excesso, podem causar desequilíbrio e prejuízos ao metabolismo da planta, interferindo nos processos bioquímicos que ocorrem no seu interior. Com o metabolismo afetado, as funções vitais são prejudicadas e os danos podem refletir na produtividade e sanidade das plantas.
O boro é um dos nutrientes que causa danos por toxidez quando está presente em grandes quantidades, podendo afetar culturas como o cafeeiro e o morangueiro. Os sintomas apresentados na cultura do morangueiro podem ser a descoloração e necrose das bordas das folhas, conforme apresentado na imagem a seguir:
6 – elevação do ph
Alguns fertilizantes, como a cama de poedeiras e compostos de restos vegetais, têm o potencial de neutralizar a acidez do solo exercendo o efeito de calagem. Desta forma, o uso exagerado e contínuo de determinados fertilizantes pode promover o aumento do pH a níveis acima do que é desejado, causando a indisponibilidade de alguns micronutrientes como o ferro, cobre, manganês e zinco.
Na tabela a seguir estão apresentadas as condições de disponibilidade dos nutrientes para as plantas, conforme os níveis de pH do solo.
7 – meio ambiente
Com a fertilização, busca-se atender as necessidades nutricionais das plantas através do suprimento de nutrientes ao solo. De toda carga aportada, uma parte é incorporada ao solo e posteriormente absorvida pela planta, enquanto a outra parte pode ser perdida para o ambiente através da volatilização, escoamento superficial e/ou lixiviação.
Do ponto de vista ambiental, o escoamento superficial pode conduzir porções de solo carregadas com fertilizantes e defensivos para arroios ou rios que estão próximos da área de cultivo, enquanto a lixiviação pode conduzir nutrientes como o nitrogênio para os lençóis freáticos. Em ambos os casos, a contaminação de recursos hídricos pode causar problemas para todo o ecossistema deste meio, inclusive para os seres humanos que utilizam a água. Com o excesso de adubação, a porção de adubo perdida para o ambiente é maior, aumentando os riscos e a gravidade de contaminações ambientais.
conclusão
A adubação é uma das etapas mais importantes no cultivo, e portanto, deve ser realizada corretamente. Por isso, na hora de calcular a dose de fertilizantes que será aplicada, é importante consultar materiais de apoio como manuais de adubação e recomendações de institutos de pesquisa, bem como consultar um agrônomo.
O parcelamento da adubação em doses espaçadas é uma medida interessante para evitar desperdícios, desequilíbrios e garantir bom aproveitamento dos nutrientes pela planta. Além disso, é importante monitorar frequentemente as condições nutricionais do cultivo através de análises de solo e tecido vegetal.
É importante ressaltar que, mesmo que fertilizantes orgânicos normalmente possuam concentração menor de nutrientes quando comparados a fertilizantes minerais, eles devem ser utilizados na dose correta, não excedendo as quantidades de nutrientes preconizadas para a cultura. Mesmo que o produtor rural consiga dejetos animais a baixo custo, a aplicação de doses acima do que é necessário representar riscos à eficiência do cultivo e de contaminação do ambiente.
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Por Gabriel Wathier, Consultor e pesquisador de agronomia Elysios.
Referências
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SILVEIRA, R. L. V. A; HIGASHI, E. N. Aspectos nutricionais envolvidos na ocorrência de doenças com ênfase para o eucalypto. Piracicaba: IPEF, 2003. 13p. (IPEF, Circular técnica n. 200). Disponível em: <https://www.ipef.br/publicacoes/ctecnica/nr200.pdf>. Acesso em 10 out 2019.
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